Pelo Mundo: um colecionador brasileiro em Frankfurt, na Alemanha


Não conheço um colecionador de discos que não tenha o desejo de viajar o mundo atrás de itens novos para o seu acervo. Nessa sessão vamos mostrar essas aventuras históricas em busca de álbuns raríssimos, entrando nos subterrâneos das mais diferentes cidades ao redor do planeta. 

Pra começar, confiram a incrível jornada de Sérgio Sierpinski pelas lojas de Frankfurt e a descoberta do inacreditável mercado de itens usados da cidade alemã.

Boa viagem!

Por Sérgio Luiz Sierpinski
Colecionador

Após passar um ano inteiro ralando como garçom em Portugal, decidi retornar para o vale de lágrimas chamado Brasil, mas antes me ocorreu fazer uma visita aos meus parentes na Alemanha. Minha irmã, meu cunhado (um português muito gente boa) e minha sobrinha moram em Frankfurt há mais de quatroze anos.

Pois bem. Comprei a minha passagem de ônibus para o dia 20 de janeiro e embarquei em uma terça-feira às 9 da manhã. Escolhi ir de ônibus pois assim é possível apreciar as belíssimas paisagens do Velho Continente in loco. Cortamos a Espanha, em San Sebastian (no País Basco) trocamos de ônibus e já à noite entramos na França com o frio e a neve batendo sem piedade. No dia seguinte paramos em Paris para um rápido café da manhã, e às 15:30 do dia 21 o ônibus estacionou na estação de Frankfurt.

Após conhecer os pontos turísticos da cidade e visitar os shoppings, fui atrás de lojas de CDs e passei horas nas prateleiras de heavy metal. Meu Deus!!!  Qualquer CD oficial de praticamente qualquer banda você encontrava por lá, e com preços excelentes (desde que você ganhe em euro, é claro). 

Nos dois primeiros dias já tinha gastado a minha cota em discos, e eu não havia comprado ainda nem 1/3 do que queria, pois a infinidade de títulos era de deixar qualquer um maluco. Pelas minhas contas tinha comprado uns 30 CDs, entre eles um box do Grave Digger, um box do Running Wild, alguns do Candlemass com slipcase, um box do Moonspell, enfim, inúmeros itens fantásticos. 

Tentei não passar mais nessas lojas e shopings nos 25 dias que fiquei em solo germânico, porém havia um objeto que queria muito comprar: uma caneca de choppe alemã, daquelas bem antigonas, artesanais, onde cabia quase um litro e tinha uma tampa que você abria e fechava com o polegar. Comentei com o meu cunhado, no que ele respondeu: "sem chance, isso só se encontra em museus aqui". Mas depois de pronunciar essas tristes palavras, ele me disse: "peraí, tem o mercado tradicional nas manhãs de sábado às margens do rio Main, podemos ir lá tentar procurar".


No sábado de manhã, em um belo dia de sol não muito frio para os padrões europeus, lá fomos nós em nossa jornada em busca do cálice sagrado. Após uns quinze minutos encontramos uma vaga para estacionar a seis quadras da ponte, pois o local fica em uma região central, mas antes vou explicar como funciona esse mercado. O nome em alemão é "mercado do piolho",  e ele fica nas margens do rio Main, que corta a cidade. Ele existe desde a época medieval, quando os aldeões ali vendiam ou trocavam alimentos, animais, utensílios domésticos, ferramentas, etc.

Chegando lá a minha surpresa foi grande. Eram pelo menos uns dois quilômetros beirando o rio, com todo o tipo de gente vendendo todo o tipo de coisa que você possa imaginar: roupas usadas, calçados, relíquias da Segunda Guerra, louças, artesanatos, eletrodomésticos, quadros, livros, revistas, gibis e por aí vai. Após uma hora encontramos a caneca que eu queria, de porcelana artesanal, raríssima e por um preço pífio. Já estávamos nos preparando para ir embora quando vejo uns headbangers passando com vários LPs embaixo do braço. "Epa, acho que deve ter algo que me interessa por aí", disse para o meu cunhado.

Dito e feito!  Andamos mais uns metros e chegamos na parte musical da feira. Havia somente vinil e alguns CDs. Eram várias pessoas, algumas sentadas, outras em pé, com banquinhas iguais as de camelô, repletas de vinis de rock, pop, música clássica, e, é claro, heavy metal. Eu nao sabia em qual ir primeiro!   Enquanto fuçava em uma caixa no chão os LPs que me interessavam, olhava de relance ao lado ou mais ao fundo e via outras pessoas com outros discos. Aquele dia foi um misto de alegria e tristeza, pois não falo alemão e dependia do meu cunhado para negociar com o povo, pois tinha levado dinheiro apenas para comprar a caneca e já estava chorando por dentro.

Os primeiros vinis que comprei foram o "Rocka Rolla", "Point of Entry" (capa diferente e com encarte) e "Best of" (coletânea rara da Gull Records, primeira gravadora da banda), todos do Judas Priest. Cada LP me custou 4 euros, todos impecáveis, pois na maioria são colecionadores se desfazendo de seus itens. Andando e fuçando mais um pouco comprei o primeiro do Kiss (em estado razoável); o "Dynasty" (com encarte e quatro posteres) e o "Rock´n´Roll Over", também do Kiss; o "Long Live The Loud" do Exciter; o "Thundersteel" do Riot; e o "Sun and Steel" do Iron Butterfly. Todos por uma pechincha, em torno de 3 euros cada.

Enquanto meu cunhado pechinchava com o simpático vendedor, eu corri para outra banquinha parecendo uma barata tonta quando cortas as antenas, sem saber onde ir. Foi o tiro de misericórdia!  Lá vi o primeirão do Black Sabbath com capa dupla e encarte, novíssimo. Peguei o disco na mão e quando o meu cunhado pediu o preço, veio o susto: 20 euros!  Eu só tinha 10 euros na carteira e o meu cuinhado só havia levado o cartão de crédito. Bem, pelo consegui segurar o item mais raro que já vi do Sabbath, e nesse o vendedor nao dava um centavo de desconto. O pior foi vasculhar as caixas de LPs do cara e encontrar bootlegs do Black Sabbath com o Ozzy, com o Dio e com o Ian Gillan. Como estava quase duro nem perguntei os preços, mas já pensava em vir no próximo sábado e arrematar tudo. 


Como me restavam ainda alguns trocados, abusei da paciência do meu cunhado e fui garimpando entre o emaranhado de pessoas mais LPs. Peguei ainda o "W.A.S.P." do grupo de Blackie Lawlwss, "Hellbound" do Warlock e "Alive II" do Kiss com os encartes. Na hora de pagar o cidadão teve a covardia de me alcançar outra caixa com mais vinis, e que desde aquele dia nunca mais vi pessoalmente. Sintam o drama:

- Bathory - o primeiro lançamento, da primeira prensagem, quase impossivel de se encontrar;

- mais três discos do Bathory que não lembro quais são. Todos pareciam ter saído da loja naquele momento, estavam impecáveis:

- Metallica - bootleg triplo com o último show com o Cliff Burton;

- e os que doem até hoje: "Show no Mercy" e "Hell Awaits" do Slayer, ambos em vinil duplo, gatefolds, com músicas bônus e posteres gigantes.

Tirando o do Metallica, que era mais caro, os demais custavam 10 euros cada, e eu ali,  completamente liso. Pedi para o meu cunhado falar para o cara vir no próximo sábado que eu levaria os discos, pois a grana pra passar o resto dos dias eu ia torrar ali mesmo. O fato é que nos dois sábados que fiquei por lá não fui mais neste mercado por imprevistos causados pelo mal tempo de inverno e por estar em outra cidade alemã, mas as lembranças ainda estão vivas, me corroendo. Hoje, com a volta do vinil, duvido que encontre esses itens pelos preços que vi há cinco anos atrás, isso se encontrar.


Seguem algumas fotos deste fatídico dia. Não tirei nenhuma do mercado propriamente dito, e sim em cima da ponte do rio. Em uma das imagens aparecem até alguns dos LPs que comprei. Lembrando que o mercado fica na margem esquerda do rio.

Além disso, há também uma foto do castelo onde foi realizado o filme "O Nome da Rosa", clássico com Sean Connery. Esse castelo fica em uma cidade próxima a Frankfurt. Infelizmente nao pude tirar nenhuma foto dentro do mesmo, pois ele estava em restauraçao e fechado para o público.



Comentários

  1. Sérgio, esse seu texto ficou muito bom. Dá vontade de conhecer esse mercado e levar tudo o que encontrar pelo caminho ... hehe ... Parabéns!

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  2. Grandes aventuras em terras germânicas !!Gostei desse texto, bem interessante e reflete o que sentimos quando estamos atrás de algo que nos interessa...Alles Gutte !!

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  3. Estive em Frankfurt em 99 quando voltei de minha viagem à Inglaterra e a cidade é muito bonita mesmo.Pena que foi apenas uma hora no solo de Nietzsche...

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  4. Nunca estive fora do Brasil. Paraguai não conta, assim como Rivera.

    Fábio, você poderia contar pra gente suas aventuras recentes em Buenos Aires. Daria um ótimo texto, com certeza. Topa?

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  5. Vamos lá !!Só preciso de um tempo, estava até há pouco explicando matemática para minha filha...(hehe).Coisas de pai, família, casamento e outros...

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  6. ... hehehe ... imagino. Eu estava até agora a pouco cuidando do Matias, que pegou uma gripe ... vida de pai é assim mesmo, mas o sorriso deles recompensa qualquer esforço.

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  7. Acho que sei como o Sérgio se sentiu. Passei maus bocados qdo estive em Paris, na Virgin e FNAC. A minha esposa mandou ou olhar metralhadora "isso tudo não!". mesmo assim deu para trazer umas coisas legais. Selecionar o que levar, sob pressão, não é fácil! hehehe

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  8. Realmente, em alguns casos desenvolvemos técnicas avançadas para acobertar compras enormes. Mas eu não me sinto à vontade em comprar discos ao lado da patroa. Me sinto muito pressionado.

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