A passagem de Otis Redding pelo Fillmore West no final de 1966


Por Ricardo Seelig
Colecionador
Collector´s Room

20, 21 e 22 de dezembro de 1966, Fillmore West, San Francisco, EUA

Otis Redding foi tocar no
Fillmore West no final de 1966 por um motivo bem simples; para todos os músicos que Bill Graham perguntava quem eles queriam ver no Fillmore, a resposta era a mesma: Otis Redding. Ele era o cara para a galera de San Francisco. Paul Butterfield o indicou, Jerry Garcia o recomendou e Grace Slick assinou embaixo. Resultado: o lendário promotor pegou um avião e foi até Atlanta e, de carro, dirigiu até Macon, cidadezinha no meio do nada onde Redding morava e mantinha a sua base. A princípio meio desconfiado, Otis fez a sua equipe de produção submeter Graham à uma longa sabatina de perguntas, incluindo o perfil dos jovens que frequentavam o Fillmore, que roupas vestiam e que tipos de drogas eles usavam, tudo devidamente respondido, com calma e paciência, por Bill, um cara caretaço e com um figurino pra lá de conservador.

A cena de San Francisco ficou em polvorosa, todo mundo queria abrir para Otis. Foram escolhidos o Grateful Dead para a primeira noite, Johhny Talbot and De Thangs para a segunda e Country Joe & The Fish para a última. Todo mundo veio assistir Redding. Janis Joplin chegou às três da tarde do dia do primeiro show para ter certeza de que iria conseguir um lugar bem na frente. Membros do Quicksilver Messenger Service, Jefferson Airplane e Michael Bloomfield estavam na plateia.


Otis chegou acompanhado de sua super banda de dezoito músicos, a Robert Hathaway Band. Subiu ao palco sem pressa, vestindo um terno verde, uma camisa preta e uma gravata amarela, com uma corrente pendurada no cinto. E o Fillmore veio abaixo já no primeiro "yeah" que saiu de sua boca! Um showman de mão cheia, Redding contagiou a audiência alucinada, emendando um clássico atrás do outro, sem dar fôlego para o público respirar e entender o que estava acontecendo.

Repentinamente, lá pela metade do set, Otis avistou uma jovem negra belíssima usando um vestido com um generoso decote, debruçada na frente do palco, enfeitiçada com o que acontecia em cima dele, suspirando sem parar, quase tendo um orgasmo com a performance do cantor. Redding andou em sua direção, agachou-se, olhou fundo nos olhos da jovem e largou: "
essa vai com tudo para você, querida. One, two, yeah!". O público vibrou em êxtase, e a jovem entrou definitivamente em outra dimensão.

Otis saiu aclamado do palco, e, ao chegar ao camarim, olhou para Graham e sapecou: "muita mulher bonita aqui, mulheres muito bonitas". Bill perguntou o que poderia fazer por ele, e o cantor pediu "um negócio grande com gelo e 7-Up", já que havia acabado de chegar da Inglaterra e lá a bebida era sempre quente. O problema era que a máquina de fazer gelo do Fillmore havia quebrado. Graham não teve dúvida: andou um quarteirão até um mercado que havia por perto, comprou um saco de gelo e voltou correndo ao Fillmore. Foi até o balcão , picou o gelo e o colocou em copos com a bebida. Ao regressar ao camarim estava ofegante, o que levou Otis a perguntar o que havia acontecido. Bill respondeu, e o soulman ficou abismado com a atitude de Graham, já que ninguém nunca havia feito aquilo por ele. Otis abraçou Graham e disse: "a partir de agora, quando eu tocar aqui, vou tocar pra você". Pronto. Otis Redding fez os dois shows restantes, ambos também concorridos e elogiadíssimos, e saiu consagrado da lendária casa de shows.


Essas apresentações de Otis Redding no Fillmore West foram fundamentais para levar o som do cantor para uma audiência formada predominantemente por jovens brancos de classe média alta. O jornalista Ralph Gleason, que escrevia para um dos principais jornais de San Francisco, deu a Otis uma das melhores críticas que ele já recebeu, dizendo que o soulman era simplesmente a coisa mais sexual que ele já tinha visto na vida. Os shows foram o primeiro passo para tornar Otis Redding conhecido pelo grande público norte-americano, alavancando a venda de seus discos e o transformando em um dos ícones da soul music.

Otis faleceria quase um ano depois, dia 10 de dezembro de 1967, mas a sua música ficou para sempre na mente daqueles que tiveram a oportunidade estar na plateia desses shows antológicos.

Comentários

  1. Que loucura bixo ver o soulman colocar abaixo o Fillmore,para nós pobres mortais podemos so sonhar com isso...

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