Minha Coleção: confira um ótimo papo com o colecionador e jornalista gaúcho Emílio Pacheco!


Por Ricardo Seelig

Nessa edição batemos um longo, agradável e interessantíssimo papo com o colecionador e jornalista gaúcho Emílio Pacheco, que já colaborou com a Collector´s Room no início do site. Em nossa conversa, Emílio falou da sua relação profunda com os discos, e em como eles mudaram a sua vida.

Emílio, em primeiro lugar, apresente-se aos nossos leitores: quem você é e o que você faz?

Minha profissão mesmo é de bancário, mas sou formado em Jornalismo e escrevo sobre música sempre que posso. Colaborei por mais de dez anos com o International Magazine, que hoje infelizmente não circula mais, e já tive matérias publicadas na poeira Zine (inclusive no último número, sobre os
Almôndegas) e uma única matéria no Globo. Enquanto houver chance, vou continuar dando vazão ao meu lado jornalista.

Qual foi o seu primeiro disco? Como você o conseguiu, e que idade você tinha? Você ainda tem esse álbum na sua coleção?

Bem, se você está especificando "álbum", acho que foi o do Roberto Carlos de 1971, aquele que tem "Detalhes". Eu tinha 11 anos recém feitos quando comprei. Aliás, acho que foi minha mãe quem me deu, a meu pedido. Isso foi na época em que minha paixão por música foi reacendida e não morreu mais. Porque, antes disso, na mais tenra infância, eu ouvia música com meus irmãos adolescentes: Beatles, Jovem Guarda, Rita Pavone, Trini Lopez. Lembro que ganhei vários compactos no meu aniversário de cinco anos. Um deles, tenho até hoje: "I Call Your Name / Long Tall Sally", dos Beatles. O LP do Roberto Carlos também deve estar entre os meus vinis, mas hoje tenho a edição em CD. Então a semente da música foi plantada desde cedo.

Você lembra o que sentiu ao adquirir o seu primeiro LP?

Lembro vagamente. Senti um certo fascínio pela capa de 12 polegadas e entusiasmo por saber que aquelas músicas estavam praticamente todas tocando no rádio.

Porque você começou a colecionar discos, e com que idade você iniciou a sua coleção? Teve algum momento, algum fato na sua vida, que marcou essa mudança de ouvinte normal de música para um colecionador?

Acho que a coleção começou com o primeiro LP, mesmo, embora eu ainda não pudesse ser considerado "colecionador". Acho que tive minha primeira atitude de colecionador quando comprei um LP do David Bowie mesmo sem ter gostado. Esse eu considero o primeiro estágio da transição de ouvinte casual para colecionador: quando você compra um disco sem gostar muito, só porque é de determinado artista. O segundo estágio seria quando você compra uma coletânea mesmo já tendo todas as músicas em discos diferentes. O terceiro estágio é quando começa a comprar edições diferentes do mesmo álbum. Por fim, eu já estou no quarto estágio, comprando a mesmíssima edição em duplicata apenas porque é raridade e apareceu a preço de ocasião. Pode ser para venda ou trocas, mas até agora não me desfiz de nada.

Outra passagem marcante foi quando vi numa banca a revista inglesa Record Collector, ainda em formatinho. Foi aí que eu percebi que colecionar discos estava se tornando algo sério.

Gostaria de acrescentar que também coleciono DVDs e compro muitos livros. Tenho mais de 30 livros sobre David Bowie, vários também sobre os Beatles e diversas outras biografias de meus ídolos. E tenho uma coleção pequena de videodiscos, projetores e filmes super 8 e 16mm. Essa está meio abandonada, mas pretendo retomá-la.

Alguém da sua família, ou um amigo, o influenciou para que você se transformasse em um colecionador?

Especificamente "colecionador", não. Todo o mundo na minha família gostava, e gosta, de música. Meu pai tocava violão muito bem, tinha um ouvido extraordinário, Minha mãe gostava de orquestras e música clássica, e meus irmãos ouviam Beatles e Jovem Guarda na minha infância, como eu já disse.
Um de meus irmãos foi locutor da revolucionária Rádio Continental dos anos 70, e trazia discos emprestados de vez em quando.

Inicialmente, qual era o seu interesse pela música? De que gêneros você curtia? O que o atraía na música?

Por tudo o que já expliquei, comecei ouvindo Beatles e Jovem Guarda na infância. Eu gostava principalmente de Roberto Carlos e Renato e Seus Blue Caps.


Qual gênero musical domina a sua coleção? E, atualmente, que estilo é o seu preferido? Essa preferência variou ao longo dos anos, ou sempre permaneceu a mesma?

É impossível escolher um só estilo. Acho que eu gosto de hard rock (David Bowie de 72-74, Queen, Kiss, Iggy Pop, The Who, Alice Cooper) na mesma intensidade com que gosto da soul music mais suave dos anos 70 (Stevie Wonder, Blue Magic, Spinners, Billy Paul, o chamado Som da Filadélfia), de
grupos vocais essencialmente acústicos (Boca Livre, Sá, Rodrix e Guarabyra, Almôndegas, Secos & Molhados, America, Simon & Garfunkel), Beatles e outras bandas dos anos 60 direta ou indiretamente influenciadas por eles (Zombies, The Mamas and The Papas, Hollies, Bee Gees daquela fase - embora goste deles por toda a carreira -, Left Banke, Monkees), rock progressivo (Pink Floyd, Genesis, Yes, Renaissence, Mike Oldfield, Emerson, Lake & Palmer) e até de 'easy listening', incluindo orquestras como a de Billy Vaughn, Hollyridge Strings e grupos vocais mais "relaxantes" como Association, New Classic Singers, Four Freshmen e outros.

Quem ler isso pode pensar: "Ah, ele acabou citando tudo o que ouve, praticamente." Mas não, esses são realmente os que estão empatados no topo, bem como eu disse. Abaixo disso tem música clássica, jazz, bossa nova, MPB, música italiana dos anos 60, reggae, disco music e até, escolhido a dedo e em doses homeopáticas, alguma coisa de samba (Jorge Ben, por exemplo), heavy metal (mas não posso ser considerado metaleiro) e até música sacra, que comecei a explorar recentemente. Meu gosto é eclético MESMO! Tirando sertanejo e blues de raiz, que soa meio repetitivo aos meus ouvidos, acho que estou disposto a dar uma chance a tudo, praticamente.

Quanto à mudança de meu gosto ao longo dos anos, eu diria que houve um despertar entre 12 e 13 anos, quando descobri David Bowie e Pink Floyd. Inclusive eu me afastei por vários anos dos artistas de Jovem Guarda que ouvia antes. Só aos 20 e poucos anos é que deixei de frescura e voltei a ouvir de tudo sem me preocupar se poderia ser considerado brega ou não. Até porque muitos dos artistas estrangeiros que eu nunca deixei de ouvir (Carpenters, ABBA, etc.) também eram considerados bregas, então era bobagem mesmo.

Vinil ou CD? Quais os pontos fortes de cada formato, para você?

Sou fã de carteirinha do formato CD. Já chegou tarde, aliás. Se tivesse existido na minha adolescência, eu teria toda a minha coleção preservada até hoje. Sei que alguns preferem o vinil, não apenas por saudosismo, mas porque dizem que tem som melhor. Se eu pudesse conseguir vinis de Krypton, que se tornassem indestrutíveis sob um sol amarelo, talvez concordasse. Mas vinil é frágil demais, além dos problemas que podem acontecer já na fabricação, como bolhas e prensagem descentrada. Sinceramente, não vejo vantagem nenhuma no vinil. O surgimento do CD foi uma das melhores novidades que aconteceram para mim como colecionador e apreciador de música.

Existe algum instrumento musical específico que o atrai quando você ouve música?

Em princípio, não. Música é o conjunto de todos os sons e o que importa é o resultado disso. Mas, dependendo do estilo, até posso citar um ou outro. No caso do hard rock, gosto daqueles riffs de guitarra como os do começo de "Sabbath Bloody Sabbath". Em músicas mais suaves, aprecio um violão dedilhado. Gostaria de ouvir mais xilofones e harpas na música popular. Mas, em geral, o que me atrai é a gravação como um todo. Acho até que, quando algum instrumento começa a se destacar exageradamente, alguma coisa está errada na mixagem ou no arranjo.

Qual foi o lugar mais estranho onde você comprou discos?

Não lembro especificamente de nenhum lugar estranho. Digamos que foi inesperado encontrar boas coletâneas da Motown em um supermercado de Lajeado, no interior do Rio Grande do Sul. E um dia ainda quero conferir uma loja de discos raros que fica numa das estações do Trensurb, o trem que liga Porto Alegre a São Leopoldo. Eu fui usuário do Trensurb por um ano, mais ou menos, e sempre que o trem parava ali eu olhava e pensava: “quem sabe não descubro algo diferente naquela loja?”. Mas nunca fui lá. Se não me engano ficava em Esteio.


Qual foi a melhor loja de discos que você já conheceu?

No Brasil, a Modern Sound do Rio de Janeiro, que infelizmente fechou. Estive lá pela primeira vez em 1989, quando fazia pouquíssimo tempo que tinha comprado meu primeiro CD player, e fiquei impressionado com a quantidade de CDs importados disponíveis. Em Porto Alegre os CDs ainda eram relegados a um segundo plano, e na Modern Sound se encontrava de tudo. Era como entrar em uma loja americana. Não lembro ao certo, mas acho que saí de lá com uns dez CDs. Pra mim, pelo menos, o Rio de Janeiro perdeu um pouco de seus atrativos sem a Modern Sound.

No exterior, estive em Nova York em 1990, e o melhor lugar para se conseguir discos raros era o bairro Greenwich Village. Têm várias lojas ótimas lá. A melhor das que visitei se chamava Second Coming Records. Mas hoje algumas lojas de discos raros de Porto Alegre não ficam muito atrás.

Conte-me uma história triste na sua vida de colecionador.

Tive um desentendimento com lojistas aqui de Porto Alegre há muitos anos, mas já passou. Eu tinha deixado reservada uma mercadoria e, no dia combinado, ela não estava lá. E era véspera de um feriado em que eu pretendia curtir minha nova aquisição. Acabei desfazendo o negócio e fiquei três anos sem entrar naquela loja. Mas depois voltei a comprar deles normalmente, e compraria de novo. A loja não existe mais, mas acho que eles ainda vendem pela internet.

Como você organiza a sua coleção? Dê uma dica útil de como guardar a coleção para os nossos leitores.

Infelizmente eu sou da ala dos que precisam de dicas. Neste apartamento alugado em que estou morando é impossível organizar. Até poderia, mas não vale a pena. Pretendo me mudar daqui.

No tempo em que eu só tinha vinil e morava num apartamento maior, dividia os LPs entre as seguintes categorias: música estrangeira, artistas gaúchos, artistas brasileiros de outros estados e miscelâneas, incluindo trilhas sonoras. Não é que eu seja separatista, é que desde os anos 70 eu tenho um carinho especial pela cena musical gaúcha, então encarava meus discos de músicos gaúchos como uma coleção à parte. Até uma certa época eu procurava comprar tudo o que saía do pessoal daqui, depois ficou impossível. Dentro de cada categoria eu ordenava os LPs por ordem alfabética de artista. E os LPs do mesmo artista eu ordenava por ordem cronológica dos álbuns.

Cheguei a organizar os CDs também, quando não tinha tantos. Não era por um critério tão rígido. Eu separava por estilo: hard rock e afins, progressivo, soul music, som pop comercial, música brasileira, música orquestrada. Como o CD ocupa um espaço exato, ao contrário dos LPs, que podem ser empurrados e apertados até um certo ponto, eu achava que seria complicado manter o mesmo critério do vinil. Cada novo CD implicaria reposicionar todos os demais. Quando eu me mudar e finalmente organizar novamente meus CDs, pretendo manter esse critério por estilo.

Além da música, que outros fatores o atraem em um disco?

Um bom encarte, sem dúvida. Ou uma embalagem atraente, principalmente no caso de box sets. Mas não estou gostando da forma como as caixas mais luxuosas começaram a acondicionar os CDs, em escaninhos de papel cortados na própria caixa, livreto ou, quando inclui vinil junto, na capa dos LPs. Gosto das box sets à moda antiga, que tinham CDs com caixinha e tudo dentro. Mas a embalagem em si tem que ser de boa qualidade, também. Por exemplo: as caixas de plástico da Nara Leão são fantásticas, fortes, resistentes e bonitas. Já as caixas de papel que têm acondicionado as coleções mais recentes de MPB são simples demais e vão rasgar rapidinho. Parece que já foram feitas para dar
às lojas a opção de vender os CDs separadamente.

Quais são os itens mais raros da sua coleção?

Não tenho certeza, mas acho que é uma edição mono em vinil do Magical Mystery Tour, dos Beatles, que herdei de um amigo da família. É o disco original americano de 1968. Tem também um EP promocional do David Bowie que encontrei por acaso em uma loja de Porto Alegre quando eu ainda nem tinha CD player, mas comprei na hora. Tem uma capa exclusiva, três faixas de álbuns diversos e uma versão ao vivo de "Bang Bang" que na época era inédita. Recentemente o show todo foi lançado em CD oficial, mas isso não diminui o valor do item em si, imagino. E tenho também um CD autografado do David Bowie, o Earthling. Consegui quando ele esteve no Brasil em 1997.

Por falar em autógrafo, embora não seja disco, também tenho a autobiografia do John Phillips, Papa John, autografada por ele. Ele assinou na minha frente depois do show de The Mamas and The Papas em 1995, em Porto Alegre. Como ele é uma lenda e já não está entre nós, imagino que o meu livro deva valer um dinheiro razoável. Mas, por enquanto, não pretendo vender.


Você tem ciúmes da sua coleção?

Com certeza! Aliás, não gosto de emprestar nada, nem livros ou DVDs. Isso me torna antipático aos olhos dos outros, mas essa mania de pedir tudo emprestado, pelo que vejo, é do brasileiro. Já andei perguntando e soube que, no exterior, não existe essa presunção de que "o que é meu é dos amigos".
Desculpem, mas eu não peço emprestado o carro de ninguém, então não peçam emprestados meus itens de coleção. Cada um preserva aquilo em que investe seu dinheiro.

Outra coisa: não me importo que os outros tenham o que eu tenho. De bom grado indico onde conseguir tudo o que eu comprei. Mas, se eu me dispuser a fazer cópias e disponibilizar tudo o que os ilustres desconhecidos me pedem pela internet, não terei tempo de fazer mais nada o resto da vida. Além de estar prejudicando os artistas, claro. Então já deixo bem claro em minha apresentação do Orkut que não faço cópia de nada para ninguém. E mesmo assim alguns insistem. Isso prejudica um pouco a discussão nas comunidades. Eu gostaria de poder dividir o meu entusiasmo por ter conseguido algum CD legal, mas sempre aparece um folgado para pedir cópia, então é melhor ficar quieto.

Uma única vez abri exceção, que foi quando disponibilizei no meu blog o CD da Carnaby Street Pop Orchestra, a que toca o tema do Esporte Espetacular. Eu encomendei aquele CD de uma gravadora inglesa que o relançou, mas ele logo saiu de catálogo. Muita gente no Brasil quer essas gravações mas não tem como conseguir, nem importando, então resolvi abrir uma exceção e disponibilizar.

Quando você está em uma loja procurando discos, você tem algum método específico de pesquisa, alguma mania, na hora de comprar novos itens para a sua coleção?

Não. Geralmente os CDs estão nas paredes, então vou batendo o olho para ver se algo me interessa. Tá cada vez mais difícil ter tempo de examinar longas fileiras de CDs em estantes, mas em geral os lojistas já sabem o que pode me interessar e me avisam.

Aproveito esta pergunta para acrescentar uma informação importante: adoro comprar pela internet. Não só CDs, mas também DVDs e livros. E antes da internet eu já tinha feito algumas experiências de examinar anúncios de revistas estrangeiras e comprar por carta, enviando os dados do cartão de crédito. Funcionava bem, mas a internet agilizou tudo. Hoje eu consigo praticamente o que eu quiser de qualquer lugar do mundo sem depender de atravessadores nem sempre bem informados. A internet foi uma bênção para mim como consumidor. Por outro lado, tirou um pouco o desafio de colecionar. Antigamente existia também o entusiasmo de descobrir o que existia, para depois então tentar conseguir. Hoje um bom site informa tudo o que sai de qualquer artista em qualquer parte do mundo, então coleção virou álbum de figurinhas: você sabe exatamente o que precisa conseguir para completá-la.

O que significa ser um colecionador de discos?

Pode significar muitas coisas. Aliás, você poderia fazer uma enquete e escrever uma matéria inteira sobre isso. Mas o que eu acho mais fascinante é a visão "não elitista" do universo da música. Explicando melhor: para um colecionador, um disco obscuro de uma banda de que pouca gente ouviu falar tem tanto valor quanto o Sgt. Pepper's ou qualquer outro álbum que apareça numa lista de 100 melhores. Tudo é música, não existe ranking.

O que mudou da época em que você começou a comprar discos para os dias de hoje, onde as lojas de discos estão em extinção? Do que você sente saudade?

A principal mudança foi a substituição do vinil pelo CD. Isso, como eu já disse, foi mais do que bem vindo para mim e até veio tarde. Em Porto Alegre, somente as lojas "comuns" estão fechando. Uma grande rede fechou várias filiais. As lojas de raridades parecem resistir bem, e tomara que continue assim. Aliás, Porto Alegre é um ótimo lugar para se morar quando se é colecionador. Pelo menos de CDs, como é o meu caso.

Em princípio eu não deveria sentir saudade de nada, mas mesmo assim vou citar as lojas King's Discos e Pop Som, da Galeria Chaves, no centro de Porto Alegre. No tempo do vinil, antes de surgirem as lojas de discos raros, o que você não encontrasse lá nem precisava procurar em outro local. As duas lojas fecharam ainda no tempo da coexistência de vinil e CD, mas acho que poderiam ter permanecido. Ainda existe a King's no bairro Moinhos de Vento, mas está bem menor.

Também sinto saudade dos bootlegs industrializados em CD. Ironicamente, essa indústria clandestina e ilegal foi talvez a primeira a ser prejudicada pela pirataria em CD-R ou via internet. Recentemente vazou na internet o álbum inédito Toy, de David Bowie. Foi minha chance de escutá-lo, finalmente. E de graça. Mas eu gostava dos bootlegs bem confeccionados, com capinha bem feita e tudo o mais. Continuaria comprando, se aparecessem.

A sua coleção tem um herdeiro, certo? O seu filho já escuta seus discos e dá palpites no que deve rolar no som da sua casa?

Meu filho é uma criança especial, ele tem autismo. Ele não mexe nos meus CDs nem em nada que não deva. Ele gosta de Erasure, ABBA e algumas músicas que gravei para ele num CD-R. De vez em quando tento mostrar algo diferente para ele, mas é difícil mudar rotinas.


Como você vê o mercado brasileiro atualmente? O que há de melhor e o que há de pior na música hoje em dia?

O mercado de relançamentos vai bem, pelo que vejo. Estão saindo coleções completas em caixas e também nessas ótimas séries vendidas em bancas, como a do Chico e a do Tim Maia. Ainda têm muitos álbuns por relançar em CD, mas acho que, com o tempo, eles saem. Existem pesquisadores atuantes, como o Marcelo Fróes (que agora tem o seu próprio selo, o Discobertas), Charles Gavin, Rodrigo Faour, enfim, tem gente empenhada em garimpar a história da música brasileira em todas as suas vertentes.

Os novos artistas é que podem estar enfrentando dificuldades. Por outro lado, existem os canais alternativos da Internet, como o MySpace e o site da Trama. É claro que, se eu fosse músico, iria sonhar com um CD lançado por uma grande gravadora, com toda a promoção possível. Mas as pessoas sempre vão querer consumir música e, de uma forma ou de outra, ela vai chegar ao seu público.

Quem me dera poder baixar músicas quando existia o programa do Mr. Lee na Rádio Continental de Porto Alegre, em 1975 e 1976. Ele rodava gravações exclusivas de músicos gaúchos e pouquíssimas saíram em disco. Se fosse hoje elas estariam disponíveis para download. Não vai muito longe: há alguns anos, descobri uma banda legal aqui do sul, a Poliéster, de São Leopoldo, e baixei as músicas deles. Hoje a banda não existe mais, mas eu posso continuar ouvindo as gravações quando quiser. Então tudo é uma questão de adaptação.

Mas eu prefiro continuar comprando música em CD sempre que possível. Não saberia dizer o que há de pior e melhor, prefiro me abster de responder a essa parte da pergunta.

Qual é o melhor disco de 2011, até o momento?

Olha, Cadão, aqui eu poderia usar a desculpa de que mal está terminando o mês de março para dizer que ainda é cedo para responder. Mas mesmo que fosse dezembro ou janeiro de 2012, acho que eu não teria resposta. Estou com 50 anos e há muito tempo perdi o ânimo de acompanhar tudo o que surge de novo. Não é que eu seja avesso a novidades, apenas não tenho mais o impulso de ir atrás delas, de tomar a iniciativa de conhecê-las. E não recebo material de divulgação, embora raramente me tenham negado o pouco que pedi para escrever algumas matérias. Até os 20 e poucos anos, qualquer novo artista que surgisse despertava a minha curiosidade. Eu batia ponto praticamente todos os dias na Pop Som para conferir os novos LPs, lia atentamente a seção de lançamentos da saudosa Somtrês, ouvia bastante rádio. Hoje, meu tempo livre mal chega para curtir meus livros, CDs e DVDs, então meu foco é na música do "meu tempo". Sim, já estou falando como velho.

De vez em quando descubro alguma coisa por acaso ou por indicação. Por exemplo, o primeiro CD do Keane, Hopes and Fears, me entusiasmou bastante. Mas os posteriores me decepcionaram. Também gostei bastante do Air, mas depois de um certo tempo acho que a fórmula deles se desgastou.
Darkness faz um rockzinho legal, com influência de anos 70. Hoje estou redescobrindo os grupos típicos dos anos 80, que na época eu não valorizava. Virei fã atrasado do Tears for Fears, por exemplo, e outros entre os chamados new romantics. Claro que eu lembro deles todos tocando no rádio, mas na época eu não gostava tanto. Então pode ser que daqui a 20 anos, se eu chegar lá, eu esteja descobrindo a música dos anos 2000.

Emílio, muito obrigado pelo papo. Pra fechar, o que você está ouvindo e recomenda aos nossos leitores?

Eu sempre ouço de tudo um pouco. Agora há pouco estava ouvindo Eagles. Agora vou ouvir Cliff Richard, uma coletânea da fase 1979-1988. É praticamente impossível para mim recomendar qualquer coisa que nenhum dos leitores conheça, então digamos assim: quem ainda não conhece David Bowie que trate de conhecer, em especial os álbuns entre 71 e 74, e depois o Outside (1995) e Earthling (1997). Quem ainda não conhece o músico gaúcho Nei Lisboa, que trate de conhecer, pois ele é tão genial quanto um Caetano, por exemplo, e canta bem. Quem ainda não conhece Zombies, uma banda genial dos anos 60, que trate de conhecer. Quem ainda não assistiu ao DVD Slaves to the Rhythm, um show reunindo as bandas produzidas pelo Trevor Horn, a começar pelos Buggles, que ele próprio integrou, que trate de assistir. E quem ainda não ouviu o Hopes and Fears, do Keane, que trate de
ouvir. Essa é a recomendação de música mais recente que eu consigo fazer.

Comentários

  1. Encontrei mais uma pessoa que gosta do Hopes and Fears do Keane. E concordo totalmente com o Emílio, os discos seguintes da banda são bem mais fracos. Gostei muito da entrevista

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  2. Valeu pelo comentário, Fernando. Gostei bastante da entrevista com o Emílio também, ele foi fundo nas respostas e bem informativo no que passou.

    E prepare-se, porque vem muita coisa boa por aí ...

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  3. Trinta livros sobre Bowie. Eu duvido que algum outro brasileiro tenha trinta livros sobre um único artista. Certamente é o maior fã de Bowie por aqui.

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  4. Enaldo, espero que seja um elogio, he he he. Eu realmente tenho mais de 30 livros sobre David Bowie, mas LIDOS, pouco mais de 20. Falta ler os outros. Por sinal chegou mais um na semana retrasada ("Starman", de Paul Trynka). Acho que, de Beatles, devem existir colecionadores com muito mais livros. Do Bowie eu sabia de uma fã que também colecionava livros sobre ele e inclusive teve um fã-clube, uma época. Mas acho que ela não mora mais no Brasil. Chamava-se Rosa Kaji.

    Aqui têm dois comentários meus sobre livros relacionados a David Bowie:

    http://emiliopacheco.blogspot.com/2010/12/biografia-de-david-bowie.html

    http://emiliopacheco.blogspot.com/2011/03/mais-livros-sobre-david-bowie.html

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